terça-feira, 31 de março de 2020

Casos para reflexão

É muito importante que estejamos abertos, sensíveis e emocionalmente fortificados quando nos depararmos com situações de preconceito, injúria e violência. Não podemos tolerar qualquer atitude ou comportamento que desqualifique ou destitua alguém de seu valor moral. 

Nas empresas, temos um conjunto de normativas que nos amparam, como o código de ética, as Leis anti-discriminatórias, os valores institucionais, contudo, nem sempre os preconceitos são descarados. Muitas vezes as violências simbólicas são veladas e escondem problemas cotidianos que precisamos equacionar para o bem estar social e saúde mental de todos. 

Vamos refletir um pouco sobre isso? Abaixo poderá observar um conjunto de cenas para que pense o que você faria. Colocamos algumas sugestões de encaminhamentos, sem a pretensão de trazermos receitas, visto que cada caso deve ser analisado individualmente, com as pessoas e conjunturas envolvidas. Os exemplos são reais e/ou fictícios passíveis de acontecer. 

*Os casos contidos nas imagens serão transcritos abaixo.  



























Transcrição dos casos: 

Um homem trans, funcionário da unidade,  fica grávido. O gestor do setor onde ele atua entra em contato com o RH para saber como será o afastamento pós-gestação. Questiona também como será aplicada a política de concessão do auxílio creche.

Se fosse o coordenador de Recursos Humanos, o que  diria?

       Licença-gestante / licença-maternidade, referente ao artigo 392 da CLT;
       Compreensão jurídica e encaminhamentos (jurisprudência) com ênfase à gestação e amamentação e não à identidade de gênero;
       Leitura institucional de reparação histórica e de benefícios como ações afirmativas correspondentes à equidade de oportunidades.

Um grupo de colaboradores vai ao restaurante no horário de almoço e começa a fazer algumas piadas com uma das funcionárias. ‘Aquela lá não conhece homem de verdade’, ‘Deve ter sido mal comida’, ‘sinto de longe o cheiro de couro’, ‘Isso é modinha’. Todos riem.
Se você fosse um dos colaboradores que apenas escutou, o que você faria?

       Não rir;
       Perguntar e evidenciar que não entendeu a piada e a colocação;
       Dizer aos colegas que esse tipo de piada pode configurar-se um crime de lesbofobia, equiparada ao crime de racismo;
       Alertar algum comitê e/ou canal de escuta institucional que esse é um tema necessário a se trabalhar;
       Se for recorrente e a empresa não tomar providências: notificar o ministério público ou Disque 100.

Uma colaboradora transexual faz uso do banheiro feminino. As outras colegas de trabalho se recusam a usar o mesmo banheiro, justificando que ela é um homem. Um dos funcionários acrescenta que se sua filha e/ou esposa trabalhassem na unidade, também não usariam o mesmo banheiro.

Se você fosse a gestora, o que você faria?
       Conversar individualmente com as pessoas envolvidas;
       Fazer treinamentos internos de sensibilização;
       Apresentar as políticas e valores da empresa e normativas que impedem a discriminação no ambiente de trabalho;
       A empresa deve ser legalista. Não há qualquer Lei que restrinja o uso do banheiro, a orientação é usar conforme indicação, ou seja, conforme a pessoa se identifica.


Em uma atividade de saúde ocupacional, o treinador mistura as equipes e forma duplas. Na atividade, os participantes farão quick massage um no outro. Um dos colaboradores manifesta um comportamento diferente, simula uma dor de cabeça, se ausenta da sala e não retorna, deixando o colega sem parceiro. O treinador o procura em particular e ele diz que não faria a massagem em um ‘veado’.

Se você fosse o treinador desta turma, como agiria?
       Trocar as duplas sem que o grupo e a vítima perceba;
       Conversar individualmente com o colaborador;
       Orientá-lo que o comportamento representa um preconceito e ato de homofobia, portanto, passível de interpretação como crime de racismo;
       Fazer uma sensibilização da equipe de modo a trazer empatia e conhecimento sobre a diversidade sexual e identidade de gênero. 


Uma funcionária travesti foi ao banheiro e estava na cabine. Entram duas funcionárias comentando sobre ela, dizendo coisas como: ‘Deus que me livre ser estranha daquele jeito’, ‘Como ele aguenta ficar com os peitos daquele tamanho, colocar silicone industrial, é louco’, ‘Seria tão bonito se não tivesse mexido tanto no corpo’, ‘Aquilo é uma aberração’.  Ela fica na cabine até as outras irem embora. Ela fica muito constrangida e pede para conversar com a coordenação.

Se você fosse a coordenadora, como agiria?
       Acolher a vítima;
       Evidenciar que o problema não está nela e sim nos estigmas e preconceitos, apontando que a cultura e as pessoas podem mudar;
       Buscar com ela uma alternativa de solução;
       Colocar as pessoas em contato com a dor do outro;
       Fazer treinamentos internos de sensibilização e sobre conceitos;
       Mostrar que todos nós construímos nossos corpos, nas academias, com tatuagens, acessórios (brincos), alguns grupos fazem pinturas e cicatrizes como práticas culturais);
       Se for recorrente, dar advertência.


Um colaborador fundamentalista religioso (que faz a interpretação literal dos dogmas de sua religião, reconhecendo-a como universal a todos) faz uma série de referências às suas crenças, comentando e condenando o homoerotismo e as identidades LGBT no ambiente de trabalho. Ele alega estar no seu direito, ponderando a liberdade de expressão, assim como os outros têm o direito de manifestar opiniões contrárias.
Se você fosse o gestor, o que faria?

       Evidenciar os valores da empresa;
       Nenhum direito humano, como por exemplo a Liberdade de Expressão, pode destituir alguém de sua dignidade, desqualificando-o enquanto sujeito moral, nem pode atentar contra a vida de alguém;
       Se for recorrente, advertência e desligamento.  


Um colaborador (48 anos) entra em contato com o coordenador de D&I e diz que não está sendo incluso nos projetos de sua unidade.  Diz se sentir preterido, que suas ideias não são mais acolhidas pela equipe de trabalho e que tem se sentido isolado. Se você fosse o coordenador, o que faria?
       Acolher o funcionário e buscar com ele uma respostas para situação;
       Se possível, nomeá-lo para alguns projetos;
       Sensibilizar as equipes de sua unidade sobre etarismo, evidenciando os pontos positivos associados à maturidade.  

Uma funcionária (59 anos) que atua no setor de operação tem faltado muito por conta de visitas ao médico. O supervisor quer desligá-la, pois a equipe tem se queixado que ela anda muito cansada e suas ausências têm impactado nas metas do grupo. Se você fosse o gerente da unidade, o que faria?
       Evidenciar que as metas e demandas são coletivas e não apenas dos indivíduos;
       Propor a realização de trabalho remoto;
       Conversar com a equipe estimulando a empatia, reforçando que todos poderiam estar na mesma situação.


Uma funcionária preta relata que vem sofrendo assédio e bullying de alguns colegas de trabalho. Alguns mexem no seu cabelo, sem seu consentimento; seu supervisor direto não a escuta quando estão desenvolvendo projetos em equipe; e uma colega do setor sugeriu que viesse de tranças para o trabalho, pois demostraria mais cuidado com a aparência. E também disse ter escutado que “muitos negros só chegaram ali graças às cotas que existem hoje”.
Se você fosse a gerente de pessoal/recursos humanos, o que você faria?

       Primeiramente, reforçar que as práticas dos colaboradores não fazem parte da cultura da empresa;
       Decidir com ela se a empresa deve tomar alguma medida punitiva, como uma advertência aos envolvidos;
       Desenvolver uma formação antirracista na empresa, sensibilizando os colaboradores sobre ancestralidade, resistência, orgulho e reparação histórica;
       Estimular políticas afirmativas na instituição;
       No caso de recorrência, apoiá-la caso queira encaminhar o caso na justiça.


Uma turista de cadeiras de rodas, ao chegar no embarque de um transfer para o porto de Santos, não consegue embarcar pois o elevador do ônibus não funciona. O guia responsável entra em contato com a agência e diz que o ônibus precisa seguir viagem, de modo a preservar o horário do grupo. 
Se você fosse o (a) agente de viagens, o que você faria?
       Garantir sua ida ao porto, por exemplo, pagando um carro particular para levá-la;
       Reportar o problema à empresa de transporte, visto que o veículo deveria ser acessível. Repassar o custo adicional para a empresa;
       Avaliar junto aos agentes de viagens se foi indicada a deficiência, de modo a sempre se atentarem à acessibilidade, não apenas física, mas também atitudinal e instrumental;
       Revisar formulários e cadastros de clientes.

Uma cliente chega à recepção e ao verificar que seria atendida por uma pessoa com deficiência intelectual, chama o gerente e solicita que seja atendida por outra pessoa, justificando que a funcionário era mais lenta que os outros e que estava com pressa.
Se você fosse o (a) gerente o que você faria?

       Primeiramente, deve explicar que se a pessoa está naquela função porque é competente para tanto;
       O gerente poderia posicionar-se ao lado da funcionária e pedir para que ela o ensine, afinal, ela sabe melhor fazer o trabalho dela;
       Se mesmo assim a cliente não estivesse satisfeita, pediria que aguardasse até que alguém estivesse disponível para atendê-la. Afinal, a colaboradora não precisaria passar por tal constrangimento.


Uma funcionária obesa pede para conversar com a coordenação e diz que não aguenta mais os comentários gordofóbicos nos grupos de whatsapp e até em e-mails. Relata que dois colegas sempre comentam sobre o peso das pessoas e que ela se sente envergonhada em se posicionar no grupo. Disse que na presente semana compartilharam uma foto de uma pessoa gorda e escreveram “Deus que me livre ser gorda daquele jeito”, “Como a pessoa aguenta ficar daquele tamanho?”, “Seria tão bonita se fosse magra”.
Se você fosse a coordenadora, o que faria?
       Acolher suas queixas;
       Buscar uma solução conjuntamente;
       Compartilhar o código de ética da empresa, reforçando seus valores, ponderando que vale também para os canais de comunicação de colaboradores;
       Sensibilizar a equipe em treinamentos de saúde ocupacional, desconstruindo padrões estéticos;
       Reforçar e afirmar a beleza de múltiplos corpos. Ver canal da Alexandra Gurgel (@alexandrismos no instagram).

Uma funcionária refugiada e muçulmana passa a compor o quadro e seus colegas a chamam de mulher-bomba. Outros dizem que ela deveria ter ficado em seu país, Irã.
Se você atuasse nessa empresa e escutasse os comentários, o que faria?
       Explicar que o refúgio é um direito humano e, se possível, pesquisar as ações da ACNUR (Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados), agência da ONU sobre essa pauta;
       Evidenciar que esses comentários são xenofóbicos e preconceituosos;
       Propor que essas pessoas se coloquem no lugar daqueles que precisam mudar de nação para sobreviver;
       Sabe quais são os três países que mais investem em armamento bélico? Estados Unidos, China e Rússia. Ou seja, não são os muçulmanos que mais investem nisso.

Uma colaboradora indígena começa a trabalhar na empresa e você nota apatia e alguns comentários preconceituosos entre os colaboradores.
O que você faria?

       Chamar individualmente quem observou fazendo comentários preconceituosos, generalistas e estigmatizantes e dialogar sobre os comentários;
       Comunicar-se de forma não violenta sobre o ocorrido: apontar fatos observáveis, emoções e necessidades e pedidos concretos;
       Orientar a equipe quanto as múltiplas lentes que interpretamos a cultura, os hábitos e comportamentos;
       Havendo recorrência, aplicar advertência.

2 comentários:

  1. Treinamento e educação eh muito importante.. mas tanto funcionário como empresa tem q entender q assim como um novo Skill técnico tem que ser aprendido e praticado, skill's comportamentais tbm devem ser 'aprendidos' e práticados dentro da organização... quem não conseguir se adaptar ao novo cenário, terá dificuldades infelizmente...daí vem a reflexão: talvez a empresa X (que genuinamente quer ser diversa) não seja o lugar para aquele funcionário que não conseguiu se adaptar 'comportamentalmente' falando." BTW, gostei muito dos casos apresentados, pois fica mais fácil 'visualizar' e identificar situações bem semelhantes no dia a dia.

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    1. Legal, ótima consideração. É importante que os colaboradores tragam consigo esses skills (habilidades) em relação à diversidade e quando isso não ocorre, a empresa deve primeiramente desenvolvê-lo ou notificá-lo sobre as expectativas para a cultura organizacional, de modo que seus valores sejam assegurados. E quando há resistência, cabe uma penalidade ou até mesmo o desligamento.

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